domingo, janeiro 30, 2011

ARQUITETURA DE RUA

Intervenções no espaço urbano têm um significado maior para o funcionamento da cidade do que possa imaginar nossa vã filosofia. Toda intervenção vai gerar nova ocupação e novos usuários. Imagine o sistema urbano recebendo esta novidade sem que o projetista tenha se preocupado com as conseqüências.
Considerando que a arquitetura deve ser vista antes de tudo como um princípio de ordenamento que define regras básicas tanto para a distribuição espacial dos movimentos urbanos de veículos e pedestres como da localização das diferentes atividades que podem ser realizadas nos espaços urbanos, é necessário incluir uma complexa análise do entorno ou do lugar onde será implantado um novo projeto.
Para tanto é necessário conhecer as características locais de ocupação, tipologia e morfologia urbanas. Explica-se tal necessidade por duas razões: primeiro para harmonizar a proposta projetual com aspectos tradicionais da área e segundo, para identificar dentre os hábitos, costumes, condições físicas e sócio-econômicas aquelas que poderão se tornar restritivas ao projeto. Também é preciso identificar e localizar equipamentos e serviços urbanos existentes com o objetivo de conhecer sua capacidade de atendimento em função da demanda existente e da demanda pós-intervenção.
Várias visitas ao local de implantação do projeto poderão fornecer subsídios para evitar erros projetuais.
Visitando os conjuntos habitacionais de Teresina, por exemplo, em alguns, observa-se sinais de deteriorização que não estão relacionados ao sistema construtivo utilizado, mas sim, à forma como as edificações foram e são ocupadas. Outros conjuntos apresentam condições mais aceitáveis. As diferenças existentes talvez sejam o caminho para uma projetação que assegure o sucesso da implantação desta tipologia.  Dentre os conjuntos que se incluem no segundo grupo, Saci, Parque Piauí, e Itararé se apresentam com uma organização espacial em consonância aos aspectos mais tradicionais de nossa cidade, tais como: arquitetura de espaços abertos, espaços livres ocupados adequadamente de forma a propiciar a reunião dos moradores, sistema viário compatível com o da cidade, certa vinculação entre edifício e rua, interação da comunidade com a cidade através de um fluxo direto, implantação da célula habitacional e dimensões de lote que possibilitam seu manuseio por parte do usuário de forma a adequá-los às suas necessidades, etc.
Visitas ao local ou à área de intervenção permitem a constatação de fatos que se tornam elementos do partido arquitetônico a ser adotado. Voltando ao exemplo dos conjuntos habitacionais de Teresina, uma ida ao local mostra uma arquitetura cheia de constituições, ou seja, de conexões entre espaço privado e espaço público. Estas conexões permitem à população um maior controle visual dos espaços públicos e se refletem em conservação e segurança da área. Sendo assim, intensificar a relação entre os espaços públicos e os espaços privados poderá ser uma excelente condição de projetação para esta tipologia.
Trata-se de uma metodologia de projetação. Sugerimos que sair da prancheta e ir à rua olhar e assimilar suas feições e suas cicatrizes é condição básica para fazer bons projetos. A este fazer, preocupado em harmonizar a proposta projetual aos aspectos tradicionais da cidade, denominamos ARQUITETURA DE RUA.
Fazer ARQUITETURA DE RUA, parodiando Kevin Linch, é experimentar o terreno (lote ou área urbana) selecionado para edificar o projeto através de seu entorno. Esta experimentação requer conhecimento técnico e envolve a historicidade da área urbana.
Depois de analisar as legislações pertinentes acerca da exeqüibilidade do objeto arquitetônico no terreno selecionado, o arquiteto deve investigar sobre a formação e constituição urbana da área. No caso da projetação de um conjunto habitacional, o questionamento deve refletir sobre a evolução histórica do trecho urbano: Como a área se constituiu? E como ela se apresenta hoje? Como esta área se integra à cidade? Há alguma barreira à continuidade da malha urbana? Atender a estas questões implica em identificar as características tipológicas e morfológicas da área, ao longo do tempo. Portanto, conhecê-las é fator de aproximação com o objeto arquitetônico e constitui variável de projeto.
O passo seguinte é identificar a composição demográfica da área e verificar como ela se distribui espacialmente. A densidade populacional será a variável obtida e principal restrição de projeto. Outras informações importantes poderão ser obtidas em instituições governamentais e dizem respeito à variável DENSIDADE DEMOGRAFICA. São dados sócio-econômicos e estruturais. Refere-se à educação (nº de escolas e creches, demanda atendida, demanda a atender, etc); economia (renda mensal/domicílio); meio-ambiente; cultura, esporte e lazer; sistema viário; saúde e segurança.
As informações obtidas levam o arquiteto ao exercício básico de seu ofício: PENSAR. As constatações que daí decorre deverão constituir subsídios para o arquiteto projetar. Mas como refletir tais informações espacialmente, sem distorções? Esta talvez seja a primeira discussão do arquiteto em seu processo de criação. Ocorre porque precisamos considerar o rebatimento das informações como necessário à integração do objeto arquitetônico ao seu entorno, à cidade. Aliás, o exercício de refletir sobre o projeto e sua relação com as pessoas e com o entorno, acompanha o arquiteto durante todo o processo de projetação. E se tal discussão for compartilhada ao invés de ser uma atividade solitária, melhor. Trará bons resultados para o projeto. Por fim, é preciso mencionar que dentre as reflexões, um tema é especial e sua ausência é catastrófica. Basta simplesmente questionar sobre os tipos de conseqüências que a implantação “daquele objeto arquitetônico” vai trazer à região. A realização desta análise pode evitar muitos problemas – para a cidade e para o arquiteto.

3 comentários:

  1. é.... a crônica é um texto que sempre vai deixar esse aprofundamentos de fora ..... mas com o tempo a pesquisa academica vai cobrir essas brechas, as pesquisas da pós-graduação ... o importante ali, por ser uma cronica é observar como ele se utiliza do livro "Revivendo..." pra falar de uma teresina que se perdeu, pelo menos na opinião dele ...

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  2. Interessante e necessária a sua colocação, mas infelizmente ainda é irreal sua utilização, são poucas as cidades que seguem esse plano urbanistico, o que se vê é um atropelo de construções, imitações de técinas de construção fora do padrão da cidade na qual é utilizada..Mas as luta é nossa, alguém tem que ser responsável e saber dizer não na hora de propostas absurdas, é preciso ser firme às convicções de bem contruir. Um braço.

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  3. angle,a muito bom o blog e os textos, isso vai ser bem util na minha pesquisa do solo, que começa com o traçado da cidade, que é reto e cheio de esquinas.
    vou virar frequentadora!!!

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